Aqui chegando, Senhor, que poderemos te dar?

Que é que podemos oferecer a Deus, mesmo que ele não necessite de nada e sendo ele quem tudo nos dá?

18 de Dezembro de 2017

 

Por Felipe Magalhães Francisco*


Este responso, cantado em algumas liturgias, repete-se em meus pensamentos, nesta época de conclusão de mais um ciclo, que é o ano civil. Chegando ao fim de 2017, que é que poderíamos oferecer ao Senhor? Temos perdido, é certo, uma vivência religiosa de oferecimento de algo a Deus, quando assumimos uma postura de viver a religião e a relação com o divino como fonte de recebimento de graças e bênçãos, apenas.

 

As religiões, geralmente, têm um caráter oblativo: oferecem ao divino alguma coisa que intuem que o possa agradar. Também a celebração eucarística, para o cristianismo, é oblação: oferecimento, sacrifício. Em toda missa isso acontece. Mas, e nas maneiras cotidianas de vivermos a religião, temos vivido uma religiosidade oblativa, ou aquela que apenas nos deixa à espera de que Deus possa fazer algo por nós?

 

Não se espantem, os leitores e leitoras, com esta questão que tenho levantado. Bem sabemos que Deus não precisa de nada, que nós é que em tudo dele necessitamos e que, fora de sua graça, não subsistimos. Contudo, há uma intuição interessante no modo oblativo de viver a religião e a religiosidade. Que é que podemos oferecer a Deus, mesmo que ele não necessite de nada e sendo ele quem tudo nos dá?

 

Coisas boas aconteceram ao redor do mundo, certamente. Inclusive aqui, no Brasil. Nós, porém, imersos na realidade brasileira, talvez tenhamos muita dificuldade em encontrar essas coisas boas, para oferecermos ao Senhor. Confesso que, pessoalmente, tem sido pesaroso refletir sobre este ano. Dói ver o que tem acontecido em nosso país, o que estão fazendo com ele e nossa letargia diante disso tudo.

Do que podemos oferecer, não sai da minha cabeça a oblação feita pela professora de Janaúba, Helley Abreu Batista, que morreu tragicamente queimada, na busca por salvar seus alunos, naquele triste acontecimento. Há um simbolismo triste, em tudo isso, mas bastante profundo: pelo fogo, a salvação. Salvação, em primeiro lugar, não de si própria, mas daqueles que estavam sob o seu cuidado: sacrifício, sacrum-facere.

 

No gesto de humanidade de Helley, uma oblação a Deus. Não queremos, pois, apropriarmo-nos de um gesto tão pessoal, tão dela. Não se trata de universalizar a doação de sua própria vida, mas de mostrar ao Senhor o que há de melhor em nosso meio humano. Trata-se, tão logo, de devolver a ele o que infundiu em nós e que, por vezes, deixamos escondido, o amor-serviço que humaniza.

 

Ao oferecermos o que temos de mais humano em nós, mesmo que vivamos na ambiguidade de um processo de desumanização, somos nós os lembrados de tudo o que podemos ser. No oferecimento da memória de Helley, o oferecimento da vida de tantas pessoas, anônimas, que humanizam o mundo, da qual a professora se torna símbolo. Se, na eucaristia, oferecemos o pão e o vinho que serão eucaristizados e que voltam para nós como alimento de salvação; no oferecimento da vida das pessoas que se humanizam e engradecem o mundo, mesmo que no anonimato, nosso comprometimento em fazer de nossa humanidade, tal como a que Jesus nos mostrou ser possível. Dessa oblação Deus já se agradou.

 

*Felipe Magalhães Francisco é teólogo. Articula a Editoria de Religião deste portal. É autor do livro de poemas Imprevisto (Penalux, 2015). Escreve às segundas-feiras. E-mail: [email protected].

 

 

Fonte: http://www.domtotal.com

 

 

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