Recordando: Sínodo para a Amazônia (por Mons. José Celestino dos Santos)

Texto apresentado por Monsenhor José Celestino dos Santos no Sínodo para a Amazônia em Roma no ano de 2019, descrevendo a Diocese de Ji-Paraná

28 de Outubro de 2020

 

Novos caminhos para missão na Amazônia


Santo padre reconhecemos a diocese de Ji Paraná é formada de pequenas comunidades eclesiais de base missionárias. A organização pastoral tem com base o diretório, as diretrizes e o plano de pastoral diocesano. Somos 24 paróquias, 1146 comunidades, uma escola de teologia para leigos e uma escola de fé e política, além do projeto padre Ezequiel Ramin. Contamos com três casas de recuperação de dependentes químicos e dois seminários. Temo 3617 ministérios leigos distribuídos entre ministro da palavra, da eucaristia, do batismo, das exéquias e do matrimônio. Sendo que oitenta por cento destes ministérios são exercidos por mulheres. Como também a coordenação diocesana é exercida por uma mulher cristã leiga.

 

Reconhecendo que este sínodo especial é chamado à conversão pastoral e pensar novos caminhos; recordo que o documento de Aparecida propõe a missionariedade como chave para a conversão, lembrando que ela não se reduz a uma dimensão, mas é a natureza da Igreja tem sua origem no “amor fontal de Deus” (AG, 2). O dinamismo missionário que brota do amor de Deus, se irradia, expande, transborda e se difunde em todo universo. “A missão é o voltar-se de Deus para o mundo”. Somos inseridos, pelo batismo, nessa dinâmica de amor pelo encontro com Jesus que dá um novo horizonte à vida (Cf. DAp, 12).

 

A Pan-Amazônia recebeu cooperação missionária de diferentes Igrejas locais e de congregações religiosas que ao longo da história contribuíram com o processo de evangelização, marcada por luzes e sombras, acertos e erros do passado como já foi bem lembrado por vossa santidade no discurso inaugural.

 

No discernimento de novos caminhos é indispensável superar o complexo colonial de superioridade de algumas culturas sobres as outras, ditas inferiores. Neste processo faz-se necessário novos paradigmas missionários que atuem com proximidade, encontro, escuta, serviço, diálogo, fraternidade, respeito com as culturas, com os povos e com as etnias, ou seja, uma missão inculturada, que valorize as tradições, uma missão “ad gentes” com modalidade “inter-gentes”.


Neste mês de outubro estamos celebrando junto com o sínodo a “feliz coincidência” com o mês missionário extraordinário que celebra o centenário da carta apostólica Maximum Illud de seu predecessor Bento XV que já exortava aos missionários “evitar nacionalismos e a ânsia de expandir a zona de influência da própria pátria” (cf. n.43-48, Ed. CNBB).

 

Os novos paradigmas missionários pedem de todos: escuta, diálogo e testemunho. Sua santidade, agradecemos o destaque que tem dado a dimensão existencial da missão: “Eu sou uma missão de Deus nesta terra, e para isso estou neste mundo” ( EG, n. 273). A vida se torna uma missão. Ser discípulo missionário está além de cumprir tarefas ou fazer coisas. Está na ordem do ser. É existencial, identidade, essência e não se reduz a algumas horas do dia: “A missão no coração do povo não é uma parte da minha vida, ou ornamento que posso pôr de lado; não é um apêndice ou um momento entre tantos outros da minha vida. É algo que não posso arrancar do meu coração” (EG, 273).

 

A missão não se reduz a uma dimensão da vida ou da pastoral, ela é maior do que qualquer metodologia, pastoral, movimento ou atividade. Precisamos ainda superar a concepção de missão como dimensão, ela revela a própria essência de Deus que tem uma Igreja vocacionada a ser testemunha de Cristo na história. “A missão chama a Igreja para servir ao propósito de Deus no mundo. A Igreja não possui uma missão, mas a missão possui uma Igreja” (BEVANS, 2016, p. 34).


A missão é um dar e receber. Os missionários em terras Amazônicas recebem do povo fiel valores e sementes do Evangelho já presentes nas pessoas e nas culturas antes da sua chegada. O Espírito de Deus os antecipa na missão. A missão não começa com a nossa chegada. Somos cooperadores da única missão de Deus.


Considerando que a missão é sempre tarefa eclesial, de cunho comunitário e não é propriedade particular, restrita a alguém ou a um grupo, é importante considerar o caminho da sindodalidade na evangelização da Amazônia. “Uma centralização excessiva, em vez de ajudar, complica a vida da Igreja e sua dinâmica missionária” (EG,32). Diante dos seus desafios, a Igreja na Amazônia necessita ser presença constante e solidária nos ambientes urbanos, ribeirinhos, indígenas, quilombolas, pescadores e aqueles que vivem da agricultura, bem como de migrantes;  nas periferias existenciais e geográficas,  e outros através de comunidades eclesiais missionárias com ministros que, a partir do seguimento a Jesus Cristo missionário, o verbo encarnado que entregou sua vida por amor, deem testemunho de diálogo, serviço, profetismo e comunhão como Igreja católica.

 

A missão assim compreendida não é algo optativo, uma atividade da Igreja entre outras, mas a sua própria natureza. A Igreja é missão! “A ação missionária é o paradigma de toda a obra da Igreja” (EG,15).

 

Jesus, o missionário do Pai, encarnando-se, “assumiu nossas enfermidades e carregou as nossas doenças” (Mt 8,17b). “Ao ver as multidões, Jesus encheu-se de compaixão por elas, porque estavam cansadas e abatidas, como ovelhas que não têm pastor” (Mt 9,35-36).  Ele é o modelo para a vida missionária nas várias realidades vivenciadas por nós. Assim como Jesus, o bom samaritano, (cf. Lc 10,25-37), o discípulo missionário precisa considerar e contemplar os caídos, aproximar-se e cuidar deles. No horizonte maior da Pan-Amazônia, o missionário cuida da casa comum e une esforços para que a natureza (as matas, a flora e a fauna, os rios, os minerais...) não seja subjugada e destruída por grupos econômicos e políticos cujo interesse principal é o lucro.


Aquele que se fez pobre para nos enriquecer com sua pobreza (cf. 2Cor 8,9), por meio do seu Espírito, impulsiona os discípulos missionários de hoje a irem ao encontro de todos, especialmente dos pobres e excluídos da sociedade. Eles são destinatários privilegiados do Evangelho e também sujeitos e interlocutores da missão, isto é, a medida que são evangelizados igualmente se tornam evangelizadores.

 

Com eles, Jesus se identifica e se solidariza (cf. Mt 25,31ss). Escutá-los é caminho certo que faz os discípulos missionários aprenderem com eles e serem enriquecidos por eles, pois é aí que Deus revela o seu mistério de modo muito especial. Os insignificantes de hoje, os excluídos e os que não contam são constituídos por Deus para serem sinais de sua graça e do seu amor (cf. 1Cor 1,27-31).

 

O Espírito Santo, protagonista do dinamismo missionário (cf. Jo 20,21), faz a comunidade compreender que, como colaboradora de Deus, não deve cuidar apenas de si mesma. Ela aprende do Espírito a ser despojada e descentrada, voltando-se para a unidade com outras comunidades e povos, numa atitude de diálogo. O Espírito sabe articular o plural e as diferenças numa unidade maior, sem hegemonias. Ele permite, também, transformar uma comunidade de manutenção numa comunidade missionária que procura comunicar-se com os outros, especialmente os pobres, os sofredores. Esse dinamismo nos desinstala e exige de nós uma permanente conversão missionária pessoal, pastoral e estrutural (DAp, 360,370). Desta forma, “o Espírito Santo oferece a todos, de um modo que só Deus conhece, a possibilidade de serem associados ao mistério pascal” (GS, 22).

 

A missionariedade, natureza da Igreja, como vimos é transversal em todas áreas da teologia e da pastoral. Que este sínodo não perca de vista este horizonte de despertar em medida maior a transformação missionária da vida e da pastoral. Que sejamos uma da Igreja em saída, formadora de pequenas comunidades missionárias, alimentada pela Palavra de Deus e pela Eucaristia.

 

 

 

Mons. José Celestino dos Santos

Administrar Diocesano - Diocese de Ji Paraná

 

Nota: O texto foi inspirado a partir do Iluminar do Programa Missionário Nacional da Igreja do Brasil

 

 

 

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